terça-feira, 24 de novembro de 2015

Nebulosa

Minha pele ainda está quente e meus cabelos levemente arrumados após aquele momento de fúria. Ascendi aos céus e morri no pleno mar de lava e fogo que é o inferno. Eu chamei seu nome, eu busquei seu sorriso e tudo o que tive foram apenas a vastidão de uma área inóspita. Me envolvi com o hábito de permanecer sempre em pé. De joelhos nunca mais eu viveria. Assumi os riscos e hoje um gosto amargo amarra minha boca, prende minha língua.

Acabo por mim, por conta, anexando a solidão e a falta de ter para onde ir. É uma vida sobrevivida. Ontem senti seu cheiro, ouvi você me chamar, ontem eu estava esperando você me buscar, dizer que estava tudo bem e que o mundo seria nosso novamente. Ontem, eu vi você partindo, ontem eu assumi me tornar alguém melhor, ontem eu saquei que jamais seremos nós dois novamente. Ontem dormi sozinho, no relento, percebi como o sereno da madrugada é agradável aos cadáveres ao léu. De ontem em diante, os sonares pararam de responder. As memorias se mantém perdidas em algum lugar que eu não sei se quero procurar. Ontem, e apenas ontem, compreendi que certas coisas jamais serão esquecidas e que o mundo vai girando. Percebi  que a força centrifuga nos joga além do céu, num piscar de olhos. Ao mesmo tempo que a gravidade nos prende os pés no chão, cabe a nós escolher qual força agirá em nossos corpos.

Estou cansado mas estou vivo, a vida passa e eu sinto o peso disso em minhas costas, a atmosfera ao mesmo tempo que arrebenta, protege, sela, comprime, mantém, detém, priva e caleja.

Abri meus olhos novamente em mais um dia. Vi você, ali, deitada. Matei o relógio em minha cabeça.  Esta é a normalidade de quem está a margem esperando afogar-se em novos horizontes. Seja como for. Eu estarei em órbita, buscando quem sabe outros planetas, estrelas, escalas, rimas, poesia, musica, vozes... este mundo não é e nunca foi meu.


E que o satélite me seja leve.





sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Daniel na cova dos Leões

Um bicho enjaulado dentro de um lugar que não era mais o mesmo. A mente ia longe, o corpo não mais. 

Suas preces por misericórdia tentavam explicar o inevitável, não era medo de morrer ou coisa parecida. 

Estava ali, sentada, como uma criança com medo do escuro assistindo o por do sol, sabíamos que a luz artificial não iria muito longe e durante um desastre nuclear, o céu se empanturrou de cinza e marrom. Raios em meio ao pó, chuva esparsa em meio ao clima árido no qual situava sua pele.

Parecia medo da morte. Era o que parecia.

Enquanto o mundo continuava seu percurso rumo ao entrelaço das galáxias, Andrômeda estaria a 2,3 Milhões de anos-luz. O que diria do ser vivente em solo terráqueo.

Uma lágrima escorreu daqueles olhos ao ver que o mundo lhe castigava da pior forma possível, com o medo do tempo o tempo passou. Se entregar a escuridão não é de Deus ou do Diabo, a escuridão por si só é do ser humano, é digno dos seres viventes e pensantes, a dor, o retiro. É por dignidade que os seres humanos se entregam aos prazeres e se vão pelos arredores. 

Cada prazer, sua culpa, cada momento, seu pesar.


Não morria, minguava.


quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Hara

Passando os dias em uma conexão com energias tão seguras e tranquilizantes, já passaram por momentos que você se abstrai do mundo e se vê em uma espécie de bolha?

Nestes dias passados me vi descascando um coco, mas ai você se pergunta, como se descasca um coco, com uma faca, ou algo parecido? Não, o modo rustico da coisa, com as mãos, e percebi que muitas coisas na vida se assemelham a descascar um coco sem ajuda de nenhuma ferramenta, a não ser as próprias mãos. Não se iluda que bater o mesmo no chão seria uma rotina, em nenhum momento se pode dar com os problemas assim, jogar no chão para ver se algo acontece. A incerteza tomava conta de minha cabeça quando me via sem uma pedra afiada ou algo do tipo, o método rudimentar nem sempre é o correto. Mas, bem, sem explicações e veremos as considerações finais.

Ao verificar o fruto como um todo, percebi algumas imperfeições, e começa por aí, nada na vida é perfeito. Mas para se chegar ao final com alguma qualidade, é necessário que as coisas sejam estudadas e é necessário saber lidar com elas, entendendo que a qualquer momento eu poderia simplesmente desistir, jogar o coco no lixo e simplesmente continuar caminhando. Bem, não sou assi e nunca o serei, eu esgoto todas as alternativas antes de dizer que não consigo.

Ao ver que uma das falhas levava às fibras, retirei a mesma com uma força digamos, grande, e venci a primeira das inúmeras imperfeições. Dali para a frente, fui retirando fibra por fibra, até que meus dedos começaram a ficar com um tom amarronzado por conta das substâncias que continham no fruto, entendendo que na vida você pode ficar com marcas eternas em relação aos problemas e isso você terá que saber lidar, se as marcas forem um incômodo, você nunca deveria tentar abrir um coco com as mãos, se o medo é se sujar, você deve manter as coisas como estão e simplesmente desistir.

Partir para as laterais, tendo em vista que em um espaço de 2 cm, as fibras estavam todas arrancadas e as células de massa que continham no fruto, já eram complicadas de retirar, precisei abrir espaço para as laterais, uma tarefa difícil que foi necessário utilizar as unhas, numa dessas investidas, a unha do meu dedo polegar virou para cima, me causou dor e aflição, ao mesmo tempo que ficou com um ponto preto de sangue pisado no local onde dobrou, minha escolha por vezes era raspar o coco no chão para tirar a casca, mas esta escolha eu tive pra mim, descascá-lo com as mãos. E muitas vezes pensamos no modo mais fácil, e assim, utilizei meus dentes para abrir a casca, isso amarrou a minha boca, senti um gosto horrível em todo o meu sistema, dentes, língua, palato e garganta. Compreendi que na vida, usar os dentes muitas vezes pode fazer com que alguém se machuque e você sinta um gosto amargo na boca logo depois. E com o tempo, você se acostuma ao gosto amargo, se acostuma a usar os dentes, cabe a você saber a hora certa e se acostumar a usar os dentes para coisas boas.

Enquanto eu estava sentado por ali, descascando aquele coco, ouvi um dos ensinamentos durante uma das aulas de relaxamento que passavam por ali. O mestre perguntou, qual das faces você prefere, a sua testa franzida ou um sorriso nos lábios? Muitos foram no senso comum e escolheram sorriso nos lábios, um deles levantou a mão e disse que preferir os dois. O mestre então, dentro de sua sabedoria concluiu que é necessário gostar dos dois, pois se você sorrir sempre e para tudo você não será respeitado, e se você franzir a testa para tudo você será sempre rabugento, por isso é necessário as duas faces, utilizadas na hora exata.
Na metade do processo, mãos doloridas e queimadas. Pontas dos dedos até hoje ainda sensíveis e as celulas do fruto entre a unha e a carne, grudadas e queimando a pele abaixo da unha. Um incomodo necessário se eu quisesse por fim chegar ao meu destino. Sentei em outros lugares, vi outras coisas, pessoas me olhando com cara de “O que esse maluco está fazendo”, como resposta, mentalizada, eu dizia, estou vivendo. Restando apenas alguns lances de casca e fibras, usei meus dentes para descascar o coco por completo, restando ainda a casca do meio, esta, impenetrável, não havia fibras para retirar e nem maneira de usar os dentes, ela era dura, seca e escura. Foi quando percebi uma abertura em uma pequena parte mole, pressionei com o polegar e ela foi rachando até que afundou e rasgou.

Dentro daquela capsula, estava o néctar, estava o manjar dos deuses. Em termos populares, a laminha. Espessa e doce, uma grande camada de polpa. Após passar por todo o processo dividi esta delicia com as pessoas ao meu redor, nos esbaldamos, sentimos felicidade, nos olhamos e estávamos em comunhão. Foi um dos momentos mais sublimes que já passei.

Minha compreensão sobre o modo de vida e sobre a própria existência mudaram nestes dias, tive um contato com a natureza de uma forma que eu nunca pensei que teria, o respeito e a conexão entre os seres é algo sublime em tal ponto que chega a ser transcendental. Nestes dias, busquei o olhar dos bichos, fotografei os templos e vi pessoas realmente em paz com o mundo, em sua própria forma de ser.


O mundo não para quando nos machucamos, e não para quando estamos felizes. A vida, deve ser vivida em sua amplitude de forma a explorar o todo, como fiz com o coco. Compreendi que o mundo é livre e que a vida deve ser vivida por completo, com machucados, hematomas, sorrisos, amargor na boca e o mais importante, deve ser intensa no próprio modo de ser. Não se explica a vida, se compreende e guarda as experiências para si. Logo, a única coisa que você pode dividir com os seus iguais, são os resultados de suas experiências e jamais as próprias. Somos indivíduos enquanto seres humanos, somos comunidade enquanto animais e somos sozinhos enquanto núcleo.



sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Colônia

Diário de bordo, data solar, calendário gregoriano aos 16 de Outubro de 2075, Marte.

Cá em Marte o ser humano ainda não convive com a atmosfera, não somos capazes de respirar lá fora, sobrevivemos em meio aos laboratórios de pesquisa e as cidades compostas unicamente de vida artificial. Ontem alguns corajosos tentaram respirar sem aparelhos e roupas próprias, não duraram muito tempo, os olhos pareciam saltar e eles sufocavam com o ar rarefeito. Alguns outros ainda pensam que é loucura manter uma colonia de povoamento no planeta vermelho.

Por aqui já inventaram a mídia, possuímos inclusive alguns outros corajosos que militam contra o estado e pensam em deposição. Atentados a bomba não funcionam por aqui, nem aviões e nem terroristas, aqui, o mal é o ativismo.

Após algumas décadas, entenderam que descobriram apenas metade do planeta e a outra metade, inabitada, está sucumbindo aos caprichos do planeta azul. Não há guerras por aqui, não há problemas maiores do que a própria atmosfera.

Por um instante imaginamos que causamos um colapso na órbita maciana com o peso das construções, o planeta passou a girar de forma errada e agora está parecendo uma bola oval, está penso.

Caminhando entre as areias dos desertos (aqui só existe deserto, excetuando as cidades construídas), percebi que há outro tipo de vida caminhando comigo. Algo mais rude e perfeito que o ser humano, mas não há amor.

É uma afronta ao rústico planeta, dizer que homens são de Marte, na verdade o ser humano como um todo, é terrestre, um planeta micho com água em abundância, terras férteis e animais vivendo em comunhão com a natureza verde.

Dizer que o homem é de Marte é uma burrice tamanha, ninguém pode viver aqui sem as artificialidades, fingindo ser aqui, a Terra. A todos um salvo conduto para que o retorno seja breve, que a população tenha consciência de que Marte é um lugar para poucos.

Sei que estou preso a este sistema e que nunca mais saberei de meus amigos e minha família, eles lá e eu aqui. Que as futuras gerações prefiram esquecer essa ideia maluca. Aqui, a unica coisa que me deixou de queixo caído foi a vista do espaço no pico de Olympus Mons, porém, de Olimpo não tem muita coisa, aqui não existe Deus.


Câmbio e desligo.


O Silêncio

Sentado no balcão de um bar, enquanto degustava um pingado para aquecer e esquecer, despertar e pensar na rotina, o barman servia os convidados. Ele girava em movimentos rápidos em sua órbita, cheguei a conclusão que ao mesmo tempo que o planeta gira em função centrifuga, nos afastamos de nosso foco. O mundo ainda segue e as noites insistem em manter o mistério, o escuro.

A Lua observava tudo aquilo acontecendo sem se posicionar sobre os assuntos mais macabros, em seu lado escuro, a relação triangular entre os iguais estava mais do que clara, a formação dos astros era algo sublime.
Não estou sendo mais do que fui e nem menos que que poderia ser, as memórias se misturam ao silêncio, quebrado pelas palavras do homem que se sentou ao meu lado, semblante parecido com o que a vida nunca disse a ninguém, perseguindo seus sonhos e mantendo sua posição, confortável, eu era único, o homem era alguém que não se mostrava e o Barman com sua face escondida, víamos suas costas, alguém que ele nunca sonhara. Notícias de Bremen, Osterholz-Scharmbeck...

Ao meu lado eu via alguém que chegou até ali com uma história, mãos nas mãos e o conto de fadas chegou ao fim, eu morreria como vim ao mundo, sozinho. Eramos 3 de inicio, mais as faces no espelho, eramos 6. O pingado se transformou em um trago entre um cigarro e outro, estávamos em decadência plena, era hora de partir, assumindo as órbitas e mantendo os contratos.

As engrenagens eram simples, o trabalho em seu start era o maior do problemas. A autorização a grosso modo seria um convite a transgressão, desde pequenos aprendemos a pedir e agradecer seja lá para quem fosse. “Por favor”, “muito obrigado”, “bom dia”, “boa tarde, “boa noite”, “tudo bem?”, “tudo indo”.

O céu azul de nuvens paralelamente correndo em direção ao céu azul de nuvens que corria em direção ao céu azul. Fechar os olhos e cair na contradição de que o mundo servia apenas como transporte, transitório, modesto, honesto... o que você planta, você colhe. Durma bem, meu anjo, não morra, não se vá, não transite entre os mesmos locais, escolha outros paradeiros e mantenha a sua órbita.

Nada além de ser o herói enquanto um abraço sincero de boas vindas recebia as almas no paraíso. As árvores sofriam com a força dos ventos, um cello ao fundo anunciava a hora de partir, despertadores, horários, regras, mapa-mundi, entre um Whisky e outro, chegávamos ao contato extremo entre o ser humano e os movimentos retilíneos que acusavam a forma robótica de controle. No fim do túnel, a resistência.

Somos únicos enquanto indivíduos, somos apenas mais um, enquanto máquina.


Olhei para o lado e vi um robô. No espelho atrás do mostruário, dois. O terceiro, este surgiu em outro lugar, atendia a outras demandas e histórias.

Pedi licença e me levantei, deixei uns trocados no balcão e o mundo escureceu novamente.


quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Hvarf heim

Enquanto o vento frio batia em sua face e ligeiramente empurrava-o de volta para o mundo, a vista do alto daquele precipício parecia tão forjada a ferro, concreto, fumaça e asfalto. Os carros passando logo abaixo de seus pés criava um clima de tensão e ao mesmo tempo de alívio, ao fundo um piano dissonante anunciava o triste fim de tantas almas ao largo, distante dos olhos mas ainda assim no horizonte, os arvoredos, chafarizes, pessoas em momentos de descanso e descaso.

Entre jornais e revistas, o jornaleiro apontava para as notícias enquanto discutiam politica, entre acusações e defesas não se chegava a lugar nenhum. Felizes dos ignorantes e dos praticantes de Tai-Chi que pareciam vencer a gravidade com seus movimentos lentos e precisos, tinham uma perfeita leitura do funeral que viviam naquele insensato momento, entre uma defesa e um posicionamento arremessavam suas energias e retomavam seus lugares, concentravam, retraíam e reagiam.

Um vendedor ambulante passava por ali, buscando seu sustento e no café ao lado do banco, descolava um a mais pelo trabalho, tinha amizade com o dono e meio que lanchava por ali, denominado de “La Ruelle”, o café era mais amargo que o esperado e os croissants pareciam saltar da estufa, sempre quente. O dono do café, não denominado por ninguém que atendia, era um rapaz de meia idade, simples e conciso. Tinha por amigo apenas o vendedor.

Pela rua ao lado, no entremeio do largo em que situava todas essas pessoas, um carro passava em alta velocidade, causando espanto dos que viviam naquele momento em estado de decadência, estatelados, inertes, neutros, que apenas reagiram ao som do motor em ascensão que nas altas rotações, explodiu o combustível em uma marcha reduzida.

Buzinas, pontos de ônibus e estações de metrô, linhas de eletricidade cortavam o meio fio em uma parábola negativa entre as nuvens e as árvores. Saltando entre as pessoas, o velocista parou para olhar a dançarina que buscava acolhimento. No café, sentado em uma cadeira e debruçado no balcão, o Pierrot, enfadonho, lançava-se ao ar em passos “Croise Devant”, “Effacé Devant”, “Plié”, “Grand Jeté”, “Croise Devant”, “Effacé”...

Fade out para o precipício, onde se encontrava nossa testemunha ocular deste cotidiano. Surgia entre as nuvens um avião de grande porte que em um rasante deslocou o vento como uma leve brisa. Abraçou pelo última vez seu urso de pelúcia que ganhou ao nascer, com o qual crescera e com o qual tivera todas as confissões e motivos.

Um coração despedaçado pela vida que tivera, uns gritos de desespero invadiam seus nervos, o frio na espinha mantinha o arrepio em sua pele, pelo momento. Por hora, na praça em vista, perpétua, plena. O coletivo atravessava sua faixa, lotado. Admiravam a beleza do ser maior. Todos respiravam, sentiam, enxergavam por suas expectativas e suposições quem seria o responsável pelo inicio de todas as coisas. Só não entendiam que em alguns casos, o ser maior não poderia ser responsabilizado pelo fim das mesmas, o dom da vida por vezes era uma escolha e não um destino.


Uma lagrima escorreu de seu rosto enquanto o mundo parecia sufocar-lhe, o céu nublado escondia o Sol de todos os dias. Não chovia.


segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Hallelujah

Em algumas vezes me pego pensando em um epitáfio...

...sobre o túmulo, construímos um império, mantemos uma vida inteira. Sob o ponto de vista cético das coisas, ergue-se um momento único no mundo: O nascimento de um novo ser. Cada um de nós compõe um pedaço de uma história, a nossa história, cada um finda a mesma como quer ou como pode, as circunstâncias geralmente são trazidas por terceiros, seja pela mãe, pelo pai, pela mulher, filhos, chefe, cliente, animais de estimação, pessoas em necessidade, problemas e mais problemas que a vida nos faz questionar o mundo como um todo. De fato, no fim, você se sente massacrado pelo meio em que vive e tem dois caminhos: Desistir ou continuar, de fato é uma escolha, difícil pelo simples fato de que a vida não lhe agrada mais ou pelos fatos externos que o mundo escolheu para realizar em sua vida. No mais íntimo dos momentos, a única palavra que nos vem a cabeça é o perdão:

- Perdoo a todos que me fizeram mal de alguma forma.
- Perdoo a todos que fizeram mal a quem amo ou a quem esteve nesta vida diretamente ligado a mim. Entenda que a questão não é querer ser perdoado, mas compreender que nem todo mundo compreende as diretrizes alheias sobre o certo ou o errado.

Entenda que estes pedidos são dirigidos a pessoas nas quais não direi o nome e que servem em casos genéricos aos que já se foram:

- Peço perdão por não ser o filho que pediram, a princípio.
- Peço perdão por não ser um adolescente fácil.
- Peço perdão por não ser nem ao menos um bom aluno.
- Peço perdão pela bola que não passei.
- Peço perdão pela garota que eu fiquei.
- Peço perdão por não ter ensinado aquela matéria.
- Peço perdão por torcer contra o seu time.
- Peço perdão por correr na sua frente na fila na cantina.
- Peço perdão por não ter um emprego.
- Peço perdão por ficar horas demais jogando bola na rua.
- Peço perdão por ter xingado você.
- Peço perdão por não ter lido o livro que precisava ler.
- Peço perdão por não ter compartilhado tudo o que eu podia, eu realmente nunca soube fazer isso.
- Peço perdão por não ter como sustentar uma casa sozinho.
- Peço perdão pelas horas ruins.
- Peço perdão por não ser o funcionário do mês.
- Peço perdão por não ter mais dinheiro.
- Peço perdão pelas sonecas fora de hora e pelos gritos sem razão.
- Peço perdão por te deixar esperando
- Peço perdão por ser tão impaciente.
- Peço perdão por não ser mais.
- Peço perdão por simplesmente não entender o que você queria dizer.
- Peço perdão por minha filha.
- Peço perdão por não ter sido um bom pai.
- Peço perdão por não ter apenas levantado na hora certa.
- Peço perdão por não ter ouvido os choros noturnos.
- Peço perdão pelo ciúme.
- Peço perdão pelo mundo que eu não pude dar.
- Peço perdão pelo fim do romance.
- Peço perdão pelo beijo não dado.
- Peço perdão pelo céu sem as estrelas que eu prometi.
- Peço perdão por não trocar suas fraldas todas as vezes.
- Peço perdão por não poder te dar mais que um abraço.
- Peço perdão por não vigiar teu sono enquanto a noite seguia adentro.
- Peço perdão pelo peixe não pescado.
- Peço perdão pela carne consumida.
- Peço perdão pelo ódio semeado.
- Peço perdão pela tempestade em nossa casa.
- Peço perdão por ser apenas isso.
- Peço perdão por ser o que eu sempre fui.
- Peço perdão por não ser muito.
- Peço perdão por não oferecer mais.
- Peço perdão por não poder ser mais.
- Peço perdão por ter preguiça.
- Peço perdão por ter "pancinha".
- Peço perdão por beber.
- Peço perdão por não dividir.
- Peço perdão por ser turrão e teimoso.
- Peço perdão por não ter sido um grande amigo presente.
- Peço perdão pelas dívidas.
- Peço perdão por chorar na sua frente.
- Peço perdão por chorar sozinho.
- Peço perdão por ter falhado.

...sobre o túmulo, um pedido de perdão... ...em memória aos suicidas.

"Now I've heard there was a secret chord,
That David played, and it pleased the Lord.
But you don't really care for music, do ya?

It goes like this, the fourth, the fifth.
The minor fall, the major lift.
The baffled king composing Hallelujah.

Hallelujah, Hallelujah.
Hallelujah, Hallelujah."


Nota do autor: Esta não é uma carta de suicídio.


sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Abençoado seja

Você que me dizia para ter coragem, olhava em meus olhos meu amigo, olhava com aquela voracidade de um leão. Falava das flores, falava da primavera, sentava-se ao meu lado enquanto eu chorava as dores mais sinceras e me abraçava.

Você meu amigo, dirigia-se a mim como se eu fosse seu irmão, falava-me sobre tudo e me contava sobre suas viagens pelo mundo. Parecia um pirata, uma mulher em cada cais, uma briga em cada taberna, um tesouro em cada território, seus dias foram contados assim, com toda a experiência de um velho lobo dos mares.

Sua bravura compensou todos os anos que fiquei distante.

Cara você se foi e eu fiquei, fiquei com aquela má impressão de um mundo incompleto. Fiquei com a bola que jogávamos, com aquela telha que incomodava todo mundo em casa. Fiquei com os jogos de futebol e com o radinho de musica caipira que você escutava. Fiquei com as pescarias e com o papos que faltaram entre a gente, esses papos de homem pra homem, eu ainda era um garoto quando você se foi.

Saudades mano. Hoje eu entendo suas escolhas e entendo que o mundo não foi feito para pessoas como nós. Hoje eu entendo o que é deixar para lá. Que ser bom não é dar a cara a tapa. Ser bom é suportar, é doar-se.

Ser bom é ser algo que o mundo de hoje não sabe o que é. Você tinha essa consciência, espero ter herdado isso de você, espero um dia sentarmos para tomar um café num lugar qualquer.

Se eu soubesse, teria ido primeiro, teria te avisado, teria feito qualquer coisa para aproveitar melhor o tempo. Hoje minha pequena tem 2 aninhos, ela ia amar te conhecer.


 Abraços, a gente se esbarra em uma dessas caravelas por aí, pelos céus.



domingo, 30 de agosto de 2015

Entre a mosca e o infinito

Criamos este universo entre o escuro e o claro. O Sol nascente anuncia um novo dia, começamos a vida antes mesmo de descobrir que algumas outras coisas estão ali a mais tempo que pensamos. Antes mesmo de interligarmos pensamentos o mundo já era mundo, nos resumimos a tantas coisas e descobertas, livros e falhas, somos humanos.

Nos protegemos inclusive da luz que em abundância torra a nossa terra, nossas casas, nossas vestes e tudo o que ela toca, uma imensidão nos aguarda do outro lado da atmosfera, calculamos buracos negros e anunciamos nossa grandiosidade, o ocioso é mal visto e a merda nos remete ao lixo.

Quantas vezes viajamos no tempo quando nos vimos velhos, usados, maltrapilhos e convalescentes. Ao olhar uma foto de alguns anos atrás, temos saudade de um tempo que não voltará, em escalas humanas, partimos de um lado ao outro do mundo, nos atrapalhamos com os fusos horários e alcançamos o Karma. Enfim nosso tempo de vida se vai, num estalar de dedos.

Ditadores caem, mulheres e homens vem e vão. Preocupamo-nos demais com a beleza, com o dinheiro, trabalho, animais, selvas, com opiniões, formadores da mesma e em busca da felicidade cometemos erros incríveis. Bactérias vivem em nós, fedemos, cheiramos bem, mantemos um padrão.

Em escalas interplanetárias sabemos que as distâncias são calculadas em anos-luz, a própria luz solar demora 8 minutos humanos para atingir o planeta, estaremos sempre 8 minutos atrás do astro-rei.

Enquanto as ondas quebram, todos os anos da humanidade não significam nada. São um piscar de olhos perante as grandezas astronômicas. Até mesmo as cores e o brilho das estrelas, já deixaram de existir a muito tempo, antes mesmo de nascermos, antes mesmo de sermos humanos. Tão perto é tão distante.

Tudo passa rápido diante de nossos olhos e vemos o quão pequenos somos em relação ao espaço. O quão pequenos são nossos problemas e nossas histórias, nossas dúvidas e nossos filósofos. Não existiam pessoas pensantes e as estrelas já tinham sua vida útil se dissipando. Criamos deuses e embelezamos suas vestes. 

Criamos uma história e morremos por ela, fazemos parte dela, ainda assim, vivemos num piscar de olhos em um pífio momento entre a atmosfera e o infinito. Que a vida seja melhor, que o mundo complete seu desígnio, que as ideias se perpetuem e que os monstros que cercam a humanidade não desumanizem os iguais. Tenha em mente apenas que um piscar de olhos do ser mais inteligente, engajado, bonito e reluzente do planeta terra não chegará nem perto das grandezas dos astros.

Na melhor das hipóteses, seres de luz não seriam terráqueos e entre a mosca e o infinito, há mais coisas do que pressupõe a vossa vã filosofia.


sexta-feira, 17 de julho de 2015

Estás errado!

Dias frios são como pedras, te olham mas nunca saem do lugar. Você sente que elas não se movem e não deixam de olhar para você.

Certa vez, olhando o mar batendo nas pedras senti como se a praia fosse diminuindo a cada onda.

As pedras estavam ali, estáticas. Me envergonhei de tanta reparo que botavam em mim, pareciam velhas, aquelas que sentam-se na calçada e notam as diferenças... Devem ficar ali por muito tempo para saber o quanto cresci, o quanto algo importa ou o quanto simplesmente a minha moral é duvidosa ao sentar para ver o mar.

Duvidosa eram as pedras que incansavelmente comentavam sobre tudo, inclusive sobre as gaivotas que pareciam ficar por alguns segundos paradas no ar quando a brisa batia, elas vinham em direção a praia e retornavam ao mar quando a brisa era mais forte que suas asas batendo em ritmo acelerado e em um mergulho, voltavam ao mar.

O Sol forte de verão, as ondas, hora calmas hora inseguras, o semblante dos pescadores que voltavam com seus barcos depois de um dia inteiro de trabalho garantindo o sustento de suas famílias. Ninguém ali se olhava com diferença, nem as pedras. Elas estavam paradas, sem um piu diante de tanta beleza, pareciam dormir enquanto tomavam um bronze.

Quando de repente me vi despertando, entre algumas pessoas que me olhavam admiradas tamanha insensatez. Uma garrafa do mais puro Rum, uma chama acesa no meu cigarro e a ressaca. Minha barba ainda levemente por fazer coçava um pouco devido ao sal, meus cabelos longos e não lavados, minhas vestes penduradas em um varal improvisado e uma choupana feita de folhas e galhos.

Os pescadores eram piratas, os barcos faziam o reconhecimento da área, as caravelas ao longe imitavam as árvores que balançavam e as velas pareciam cortinas estufadas com o vento.

Naquele momento que adormeci, eu era o naufrago. Retornei a mim, a deriva em mais um dia frio de Julho, o céu fingia não chover, o vento fingia não soprar, o Sol fingia esquentar e de repente me tornei pedra.

E as pedras, ah, as pedras, estavam lá ainda, como sempre estiveram, olhando tudo e todos. Momentos antes de qualquer ação, elas nem ao menos reagiram.


Estavam ali, no mesmo lugar.


sexta-feira, 3 de julho de 2015

Vento

Céu encoberto por um certo desespero, a chuva insistia em não cair. O Ipê florido, as árvores recostavam como crianças na hora da naninha. Nada ali tinha vida, não tanto quanto aqueles dias azuis de maio, enquanto céu, enquanto vento, por enquanto mantinha-se na espreita, estreito, entreaberto, como uma porta, inerte.

O vil, convivia com aquele peso, que no muito mais onde avistava a colina a subir, pisoteava a terra e se sentia como se fosse a própria, levada pelo vendaval no qual situava. Acreditava na justiça dos seres, em plena era tecnológica onde tinha plena certeza donde o mundo era todo criado, não pelo criador mas por uma lógica de programação. Desigual nos termos vigentes pela matriz, casas, pessoas, seres sobrevoando e aterrizando. Aterrorizado com o modus operandi que levava ao findável momento.

Numa caixa, encontrou as respostas de um passado distante. Via luz, via de fato, ascendeu ao firmamento no tempo em que as sobras eram o sustento. Rebuscavam o antigo, com saudosismo, rebuscavam o futuro de forma frágil, assumiam os erros, sentavam-se em volta da fogueira, o Deus mor estava ali enquanto aquecia vossos pés, porquanto a solidez pairava no ar.

Em formato de ondas cibernéticas, o eremita pensava no seu retiro, as moças dançavam a fim de espantar o frio, os homens com as mãos espalmadas para cima sentiam o retardo mundano, proposital, criado pelo sistema apenas para enviar seus melhores homens para o matadouro. L'age d'or, dor, sentimento não eram medidos onde não se fazia o menor sentido. Pincelavam todas as cores e assim criava-se o ser revolto. A paisagem era clínica.

O cinismo encerrou as atividades desde o momento em que o Deus mor se apagou, por vontade, por simples terror. Este, se foi, convalescendo ao ambiente improprio. A censura era 18 anos, o filme era a vida, o momento era de pesar, faleceu mais uma vez, o Sol descia entre as árvores floridas dando lugar ao holofote que chamavam de Lua. Sob o aspecto vivente, no módulo lunar, a escuridão tomaria conta mais uma vez da unidade de processamento. Quanto mais frio, mais rápido. Quanto mais triste, mais remédios. Quanto mais impróprio, mais procurado. O crime aconteceu exatamente onde dizia a profecia, o profeta não era barbudo o clichê não existia mais. As abelhas se retiravam da colmeia, todas a postos para assistir o sacrifício da rainha.

Agulha e linha, tecia-se mais um remendo na colcha da vida. Preferiram remendar a construir novamente o lençol.

A censura, 18 anos.


sexta-feira, 27 de março de 2015

Num mesmo instante...

Consultavam os ancestrais
Perdiam-se no medo
Alcançavam suas preces mais profundas
Degustavam uma solidão mórbida

Do mesmo apreço
Surgiam os puros
Nos quais abriam caminhos
Para insurgir diante do inverno

Pés descalços na neve fria
A neblina cobria o acaso
Inebriante retorno
No qual era triste por simples vontade

Os pássaros não mais cantavam
Nas esguias arvores retorcidas
Buscavam alguma coisa que não sabiam
Ascendiam aos céus em sinal de desapego

No maior dos riscos
Saltavam em direção ao precipício
Presunçosos humanos
Duvidaram da força deste

O amor veio
Cortou
Matou

E deixou saudade...


sexta-feira, 20 de março de 2015

Lá vem a cidade, adaptação para texto, por Lenine.

Eu vim plantar meu castelo naquela serra de lá, onde daqui a cem anos vai ser uma beira-mar...

Vi a cidade passando, rugindo, através de mim... Cada vida uma batida dum imenso tamborim. Eu era o lugar, ela era a viagem. Cada um era real, cada outro era miragem.

Eu era transparente, era gigante. Eu era a cruza entre o sempre e o instante. Letras misturadas com metal e a cidade crescia como um animal, em estruturas postiças, sobre areias movediças, sobre ossadas e carniças, sobre o pântano que cobre o sambaqui...
Sobre o país ancestral, sobre a folha do jornal, sobre a cama de casal onde eu venci.

A cidade passou me lavrando todo... A cidade chegou me passou no rodo... Passou como um caminhão passa através de um segundo quando desce a ladeira na banguela... Veio com luzes e sons. Com sonhos maus, sonhos bons. Falava como um camões, gemia feito pantera. Ela era... Bela... fera.

Desta cidade um dia só restará o vento que levou meu verso embora... Mas onde ele estiver, ela estará: Um será o mundo de dentro, será o outro o mundo de fora.

Vi a cidade fervendo na emulsão da retina. Crepitar de vida ardendo, mariposa e lamparina. A cidade ensurdecia, rugia como um incêndio, era veneno e vacina...

Eu pairava no ar, e olhava a cidade passando veloz lá embaixo de mim. Eram dez milhões de mentes, dez milhões de inconscientes, se misturam... viram entes... Os quais conduzem as gentes como se fossem correntes dum rio que não tem fim.

Esse ruído são os séculos pingando... E as cidades crescendo e se cruzando como círculos na água da lagoa. E eu vi nuvens de poeira e vi uma tribo inteira fugindo em toda carreira. Pisando em roça e fogueira ganhando uma ribanceira... E a cidade vinha vindo, a cidade vinha andando, a cidade intumescendo: Crescendo... se aproximando.


quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Noturno

Corria o mais rápido que podia, parava, olhava para trás, respirava. Hora tranquilo, hora desconfiado. O rodo praticamente veio do nada, num impulso sistemático acabava por fazer pular na primeira rota que coube. Assolava um dos membros machucado e mancava de certa forma a se moldar as passos estranhamente aflitos. O céu, escuro, era noite, as estrelas e a lua pareciam distantes a olho nu, olhos de gato. Garras que ainda mantinham a destreza. O negro cruzando a rua ainda longe de qualquer suspeita, perecível.

Num gemido de dor ainda que provisório, buscava abrigo do sereno, rosto inchado. Arriscou um embalado momento, derradeiro, defectivo... estava usando de seus dons para prever o fim. Mais um objeto atirado onde fez com que fosse arremessado ao relento. Não sabia mais se seria aquele o último suspiro. Malditos caçadores extremamente audaciosos. Diziam capturar a preza sem lamentos enquanto os golpes deferidos se referiam ao coração, pulsos...

Respiração resultante num furo entre as vísceras. Sentiu seu fim, previu tudo aquilo antes de acontecer, como uma profecia, fez questão de encontrar o furo no tempo numa esquiva, mostrou os dentes desencorajando os pretendidos assassinos. Na guerra não há vencedores, resolveu atacar, furou 3 olhos com suas próprias mãos e transformou em frangalhos outros mebros. A adrenalina mantinha um compasso acelerado, tornando a moradia algo mais que inviável, musculos mantinham-se rígidos e a face era voltada ao alvo que já estava neutralizado após aquele combate fechado, sem lacunas, certo.

Continuou caminhando para um lugar mais tranquilo e afastado, sem que ninguém visse, tossiu, cambaleou, foi pressentindo. A visão turva era apenas um agrado ao afago que esperava em seu território. Sabia que não era o momento de pensar em outras coisas, o apego era um apelo aos maiores. Foste desta vez a caça, o caçador deixou ali suas habilidades, estava ao chão caído, inerte. Num relâmpago sentiu a chuva tocar seu corpo abatido, estava vivo, tinha certeza que poderia carregar-se para qualquer lugar, quando encostou ao lado de uma lixeira, sentiu o cheiro do jardim e do jantar, sentiu algo molhado em seu rosto, a visão ainda mais turva quando tremeu suas bases, encantou-se com a moça que passou por sua vida e ficou ali, esperando em casa. Num dado momento, diria adeus, queria que fosse eterno assim como suas memórias. Enquanto apagava devagar seus sentidos.

Defendeu sua vida, sua honra, seus sonhos. 
Estavam todos mortos.

Esfriou, agonizando, desamparado, sozinho , ossos quebrados, pele esfolada, maltratado...

O gato, era eu.


“Tá relampiano, cadê neném?

Tá vendendo drops no sinal pra alguém.”



terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Laços do Passado - Capítulo 1 - Introdução

Consuelo caminhava pelas ruas da cidade de Monterey, a 15 anos procurava sua filha que fora tirada de seus braços na maternidade “Santa Maria de Guadalupe”, quando em uma das portas enquanto saiam os familiares da família Castillo e Castro.

Murilo Adolfo, o herdeiro da família riquíssima e tradicional de Monterey, saia com seu carro esportivo pelas ruas da cidade.

Em um cruzamento não avistou Consuelo, mas evitou o pior com uma manobra arriscadíssima, freando bruscamente. Trocaram olhares enquanto Murilo saia do carro às pressas para verificar se ocorrera algo grave. Antes que pudesses trocar qualquer palavra, ela desmaiava em seus braços.

As crianças eram deixadas no internato após o fim de semana pelo chofer Cristaldo, filho de uma das empregadas da família, a Adelaide. Outra das empregadas, Francisca, era irmã de Adelaide, mais velha e estava a mais tempo com a família, cuidava exclusivamente dos interesses da Avó, Blanca.

Entre as crianças, Otávio o mais novo, Carlita a do meio e Eleonora a mais velha, esta foi adotada pela família. Após a morte de Bernardo Castro, o passado ficou sem explicação, o velho Castro levou com ele todas as chances de encontrarem o paradeiro de Eleonora. Sua morte também foi um mistério, aquele acidente de automóvel foi um marco e uma grande perda, este era adorado por toda a elite e empresários da cidade de Monterey.

Murilo colocava Consuelo no banco do passageiro, ela estava desacordada ainda mas fazia uns gemidos como se estivesse sonhando. Dizia: - Quica... Quica... onde está você Quica... Murilo sem saber o que fazer, apenas dirigia-se para sua casa onde pudesse fazer com que a moça repousasse e retornasse à consciência. Ele a olhava, estava ao mesmo tempo mexido com a moça que acabara de encontrar na rua.

Chegando em sua casa, os portões se abriam, carregavam as iniciais C&C – Castillo e Castro – ele estava exasperado, com pressa, chamando o jardineiro Clodoaldo para ajudá-lo a subir as escadas, arrumaram um lugar no quarto de hospedes e a deixaram deitada em uma cama macia enquanto ainda estava desacordada. A vovó Blanca pediu que Francisca vigiasse a moça recém chegada na casa dos Castro e Castillo.

Murilo era viúvo, desde o nascimento de Otávio, o menino carregava um grande peso por ter nascido, mas o pai jamais teria dito ou feito nada que fosse pesado demais e que lembrasse do parto em que tiveram que escolher entre a vida da mãe e do filho. Enquanto estava desacordada, o rapaz observava junto de Francisca qualquer indício de que a mulher ali deitada daria sinais de estar voltando a si.


Continua no próximo episódio...


sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

A leveza das coisas comuns

Cada vez que olhava para o lado tinha uma nova perspectiva. Seres dotados de gigantescas formas, como em “confortabily Numb”, do Floyd. Criava-se um modo no qual nada houvesse sentido a não ser o próprio ego que gritava dentro de si. Alter ego tornava-se um estranho e sentia-se mal com os poderes que assumia num curto período de tempo, a casa dos espelhos, em ruínas tão bem fundamentadas que o único meio de transmissão eram as pontes sinápticas.

A queda.

Num estranho senso de direção que apontava o norte erroneamente e tornava o mundo parecido com um modelo diferente do que se via. Cores voltadas ao escuro, trevas. Num tom violeta esquivava-se dos vermelhos, como um temporal viu-se em descrença quando cada gota d’agua mantinha seu curso durante o declínio. Espatifadas no chão transformando tudo em centenas e centenas de milímetros. O rio seguia seu desígnio tortuoso e complacente.

Quando as bombas caíram, já não restava mais nada ali, lentes  de visão noturna apenas concluíram o que já era esperado. Dizimados pela artilharia natural de um mundo onde não apenas os fortes sobrevivem, mas onde também os fracos podem se infiltrar em meio ao caos urbano instaurado pelos ditos “imperialistas”. 

Eu mando, você obedece.

O céu estava azul, como quando tudo começou. Esquecer quisera deste lado negro do mundo junto as faces da lua, sem cor, sem medos, sem vida, sem caos. O ser vivente na época não tinha ideia do que estava por vir e ainda que as profecias de cumprissem com certo descaso, o iminente ocorria em larga escala. Nas indústrias eramos explorados, as árvores que serviam de alimento foram catalogadas, nomeadas e adquiridas por um simples papel (sobrevivência), e nesta sobrevida, a seleção natural se faz presente.

Fogo, sangue, mutilações e infelizes vitoriosos, entenderam que para construir é necessário destruir. Fazer o bem já tinha um duvidoso lado. Fazer o mal já era o incerto. Morriam da cura enquanto aviões ascendiam de navios grandes e pesados, apenas compreendendo que tudo teria um preço.


As explosões retomaram seu destino, ao amanhecer.