Cansado de ouvir a mesma coisa sempre, resolveu por si só
mudar, escondido em uma trincheira aguardando a hora certa para subir ao monte
Olimpo, um rádio de uma padaria em ruínas, bombardeada pela guerra, Piaf. Era
como descrever a cena de horror ao ver sua tropa atingida por um franco
atirador da artilharia inimiga. Ver sua única bala estilhaçando o vidro da
torre da capela, atingindo o alvo, foi um alívio para os sobreviventes. Já era
difícil saber se o inferno estava ali, onde o soldado alvejado por uma bala
calibre 7.62 deitava seu corpo já sem vida.
De que adiantaria correr, olhar para os lados percebendo que
não havia para onde ir. Piaf e “La vie en Rose”, descompassado por tiros de fuzil.
O rádio parecia trocar de musica ao sentir a terra tremer com os bombardeiros
que rasgavam os céus vermelhos de outono. Era tarde, o Sol dava sua trégua
entre o pó e a fumaça.
Um cigarro, aceso no chão do botequim, cheiro de sangue
embrulhava o estômago. O credo cercava a tropa, alguns ajoelhados implorando o
perdão. Não conseguia aceitar a carnificina, muito menos a violação das leis
divinas.
Um grito de misericórdia por parte de alguns camponeses, carregavam
uma criança. Eram apenas dois, que singelamente desejavam que sua cria fosse
salva. A guerra assolava qualquer um, e não entendiam por que as bombas foram
jogadas naquele vilarejo tão distante. Eram casas, vielas, pequenos comércios e
agricultores.
O vento soprava em seu rosto, estava ali, sozinho. Sua tropa
debandada pela noite. Alguns dormiam e outros mantinham-se acordados devido ao
choque. Ninguém esqueceu das bombas, dos estampidos, dos estrondos... dormir,
era o mesmo que estar sozinho. Dormir, era sinal de fraqueza, o soldado raso,
não dormiu, por insônia. O dia amanhecia, com a mesma covardia da guerra. O
tempo parecia passar com dificuldades e o objetivo parecia mais longe. O
objetivo, permanecer vivo.
Lágrimas escorriam dos olhos ao encontrarem um ser de
natureza selvagem, agonizando entre os escombros. Não respeitariam nem ao menos
o cavalo. O bicho respirava e sabia seu fim, ninguém foi capaz de sacrificá-lo,
mas, todos os soldados remanescentes sentaram-se em volta para confortar sua
triste partida.
Levantaram acampamento e seguiram viagem, a vista para o mar
estava logo ali, no meio fio entre o céu e o inferno.