Normalmente extinta, a vida em meio ao vício, um golinho no café, um trago na bituca já apagada. As chamas esmaeciam. Enquanto isso, um furacão varria os arredores da periferia, barracos, tapumes, Eternit, zinco, barragens, caixas d’agua, e o próprio morro que vinha abaixo como uma avalanche. Um novo plano de busca era traçado enquanto o soldado em busca de piedade, atirava nos ditos zumbis, filhos do crack. Todos na mesma direção, sem destino ou futuro, sem passado e nem presente.
A cria criava-se na merda, a maioria das vezes nem mesmo chegava-se ao dito fim, a esmo. Um poder de se retirar as riquezas do solo, o cão que fuçava no lixo, viraria alvo fácil dos transeuntes que apenas observavam a imagem embaçada de um dia de sol, que castigava até mesmo os mais necessitados, para não dizer somente.
Durante a noite, o gélido prazer de passear pelas ruas escuras, iluminada ao longe pelos postes em decomposição, traria o gosto amargo na boca. Mais um gole no cafezinho e desta vez a bituca não existia mais, foste mascada.
As cinzas pelo chão do apartamento, as marcas de expressão no rosto, um tom avermelhado na pele. Escrevia algo no espelho, já machucado pelo tempo em que sobreviveu. Deitada na cama, fazendo poses, mantendo as posses, deliberando-se ao bel prazer. Satisfeita com o troco deixado pelo cliente como gorjeta. Olhava para o teto com certo desespero por não ter tido dentes para sorrir. Apenas uma calcinha fio-dental como vestimenta, cores pastéis. Acima e abaixo, ela veria apenas as cores do arco-íris surgindo no horizonte, destacando a fachada do hotel três estrelas e em suas entrelinhas.
“Meio litro de suor e oitocentOS gramas de carniça”.
Por entre feixes de luz o ar passava empoeirado, o céu em preto e branco escorria por entre as nuvens de areia. Dunas se formavam em meio ao trânsito caótico da cidade sem limites. Violência era pregada nas igrejas e sinagogas, a ferro e a fogo, abutres.