Primeiro saiba que todos estes cigarros são culpa sua.
Daquele dia em diante que olhei nos teus olhos, você me
disse alguma coisa estranha que a minha alucinação não permitiu que eu compreendesse.
Eram versos, versos deturpados pelo meu pesaroso momento de reclusão. Eu estava
exilado em meio a sinapses e meias verdades, meu corpo respondia cruelmente aos
meus comandos, era leve, bem leve, era claro, bem claro, um sussurro era como
se eu estivesse submerso. Num momento de extrema confusão eu ouvia teus
gritos ecoando dentro da minha cabeça, teus versos.
Suas vestes levemente amarrotadas dignas de final de festa,
apenas faziam com que meu transtorno se roesse por dentro, em meus ossos. Eu
olhava para os tons brilhantes, para os detalhes, para você. Seus olhos, ah,
seus olhos, seus olhos, seus olhos...
Ganesha ao meu lado, Shiva em minha frente, Krishna
cantarolava uma bela canção ao meu ouvido. Brahma bem ali, festejando a
criação. Quando num abrir de olhos, o Sol de um lado e a Lua de outro faziam
com que aquilo fosse também coroado pelos Deuses, a redenção ocorria a cada
instante que se perpetuava um dos mais belos encontros ali em minha frente, eu
estava sob o meio fio entra a noite e o dia.
Um lirismo aflorado e impetuoso. Atravessar a porta e partir
foi simplesmente o momento que durou a minha vida inteira e em memória aos
suicidas devemos brindar a vida, brindar os momentos que nos dão prazer, elevar
a nossa energia e aquecer os corações que ainda tem jeito. É um tanto egoísta de nossa parte, querer as pessoas sempre por perto, confesso que é até um espirito maternal enraizado em nossos alicerces. Querer bem e cuidar é uma
forma de amor, é simples, é bucólico...
Por fim, ao abrir os olhos estava novamente neste sofá, o
dia cobrava com o sol a pino. A luz não permitia um sono mais intenso e o
descanso foi comprometido. Meu espirito ainda levita por ai, em busca dos
Deuses, em busca de algo que faça sentido entre as pedras no horizonte e o
firmamento que contrasta com as complexas construções.
Veleiros de papel, caixas d’agua, holofotes, luzes
vermelhas, pássaros e torres de energia.