Passando os dias em uma conexão
com energias tão seguras e tranquilizantes, já passaram por momentos que você se
abstrai do mundo e se vê em uma espécie de bolha?
Nestes dias passados me vi
descascando um coco, mas ai você se pergunta, como se descasca um coco, com uma
faca, ou algo parecido? Não, o modo rustico da coisa, com as mãos, e percebi
que muitas coisas na vida se assemelham a descascar um coco sem ajuda de
nenhuma ferramenta, a não ser as próprias mãos. Não se iluda que bater o mesmo
no chão seria uma rotina, em nenhum momento se pode dar com os problemas assim,
jogar no chão para ver se algo acontece. A incerteza tomava conta de minha
cabeça quando me via sem uma pedra afiada ou algo do tipo, o método rudimentar
nem sempre é o correto. Mas, bem, sem explicações e veremos as considerações
finais.
Ao verificar o fruto como um
todo, percebi algumas imperfeições, e começa por aí, nada na vida é perfeito.
Mas para se chegar ao final com alguma qualidade, é necessário que as coisas
sejam estudadas e é necessário saber lidar com elas, entendendo que a qualquer
momento eu poderia simplesmente desistir, jogar o coco no lixo e simplesmente
continuar caminhando. Bem, não sou assi e nunca o serei, eu esgoto todas as
alternativas antes de dizer que não consigo.
Ao ver que uma das falhas levava
às fibras, retirei a mesma com uma força digamos, grande, e venci a primeira
das inúmeras imperfeições. Dali para a frente, fui retirando fibra por fibra,
até que meus dedos começaram a ficar com um tom amarronzado por conta das
substâncias que continham no fruto, entendendo que na vida você pode ficar com
marcas eternas em relação aos problemas e isso você terá que saber lidar, se as
marcas forem um incômodo, você nunca deveria tentar abrir um coco com as mãos,
se o medo é se sujar, você deve manter as coisas como estão e simplesmente
desistir.
Partir para as laterais, tendo em
vista que em um espaço de 2 cm, as fibras estavam todas arrancadas e as células
de massa que continham no fruto, já eram complicadas de retirar, precisei abrir
espaço para as laterais, uma tarefa difícil que foi necessário utilizar as
unhas, numa dessas investidas, a unha do meu dedo polegar virou para cima, me
causou dor e aflição, ao mesmo tempo que ficou com um ponto preto de sangue
pisado no local onde dobrou, minha escolha por vezes era raspar o coco no chão
para tirar a casca, mas esta escolha eu tive pra mim, descascá-lo com as mãos.
E muitas vezes pensamos no modo mais fácil, e assim, utilizei meus dentes para
abrir a casca, isso amarrou a minha boca, senti um gosto horrível em todo o meu
sistema, dentes, língua, palato e garganta. Compreendi que na vida, usar os
dentes muitas vezes pode fazer com que alguém se machuque e você sinta um gosto
amargo na boca logo depois. E com o tempo, você se acostuma ao gosto amargo, se
acostuma a usar os dentes, cabe a você saber a hora certa e se acostumar a usar
os dentes para coisas boas.
Enquanto eu estava sentado por
ali, descascando aquele coco, ouvi um dos ensinamentos durante uma das aulas de
relaxamento que passavam por ali. O mestre perguntou, qual das faces você
prefere, a sua testa franzida ou um sorriso nos lábios? Muitos foram no senso
comum e escolheram sorriso nos lábios, um deles levantou a mão e disse que
preferir os dois. O mestre então, dentro de sua sabedoria concluiu que é
necessário gostar dos dois, pois se você sorrir sempre e para tudo você não
será respeitado, e se você franzir a testa para tudo você será sempre
rabugento, por isso é necessário as duas faces, utilizadas na hora exata.
Na metade do processo, mãos
doloridas e queimadas. Pontas dos dedos até hoje ainda sensíveis e as celulas
do fruto entre a unha e a carne, grudadas e queimando a pele abaixo da unha. Um
incomodo necessário se eu quisesse por fim chegar ao meu destino. Sentei em
outros lugares, vi outras coisas, pessoas me olhando com cara de “O que esse
maluco está fazendo”, como resposta, mentalizada, eu dizia, estou vivendo. Restando
apenas alguns lances de casca e fibras, usei meus dentes para descascar o coco
por completo, restando ainda a casca do meio, esta, impenetrável, não havia
fibras para retirar e nem maneira de usar os dentes, ela era dura, seca e escura.
Foi quando percebi uma abertura em uma pequena parte mole, pressionei com o
polegar e ela foi rachando até que afundou e rasgou.
Dentro daquela capsula, estava o
néctar, estava o manjar dos deuses. Em termos populares, a laminha. Espessa e
doce, uma grande camada de polpa. Após passar por todo o processo dividi esta
delicia com as pessoas ao meu redor, nos esbaldamos, sentimos felicidade, nos
olhamos e estávamos em comunhão. Foi um dos momentos mais sublimes que já passei.
Minha compreensão sobre o modo de
vida e sobre a própria existência mudaram nestes dias, tive um contato com a
natureza de uma forma que eu nunca pensei que teria, o respeito e a conexão
entre os seres é algo sublime em tal ponto que chega a ser transcendental.
Nestes dias, busquei o olhar dos bichos, fotografei os templos e vi pessoas
realmente em paz com o mundo, em sua própria forma de ser.
O mundo não para quando nos
machucamos, e não para quando estamos felizes. A vida, deve ser vivida em sua
amplitude de forma a explorar o todo, como fiz com o coco. Compreendi que o
mundo é livre e que a vida deve ser vivida por completo, com machucados, hematomas,
sorrisos, amargor na boca e o mais importante, deve ser intensa no próprio modo
de ser. Não se explica a vida, se compreende e guarda as experiências para si.
Logo, a única coisa que você pode dividir com os seus iguais, são os resultados
de suas experiências e jamais as próprias. Somos indivíduos enquanto seres
humanos, somos comunidade enquanto animais e somos sozinhos enquanto núcleo.