Meu caro Fiodor, hoje me encontrei no limbo, hoje ao despertar percebi as horas e percebi que o tempo correu rápido demais. Quando notei já tinha passado meu aniversário e assim que levantei percebi que já se foram 3 séculos e 6 décadas. Isso me faz parar para pensar na relatividade. Encontrei um pouco de paz na realidade aumentada das versões Deus x Maquina de uma vida completamente invadida por soldados em missão de paz. Sabemos o quanto é necessário saber que a paz existe, desde que também saibamos como controlar a soberania e pegar em armas se for necessário. Sei que daqui da terra não temos muitas formas e garantias, mas ao mesmo tempo sabemos dos limites dos quais a vida se classifica, se eterniza e se mantém em pleno ciclo. Quanto mais se evolui mais próximo do precipício nos vemos e cada vez que o mundo se aproxima do final. Os seres humanos acreditam em coisas que as vezes parecem tão sórdidas e mentirosas, parecem na verdade bem perdidos, tristes, sem perspectiva. Eles tem razão, eles sabem que o fim se aproxima e que é extremamente difícil pensar que todos um dia se vão, menos nós meu caro Fiodor. Nós estaremos sempre em algum lugar, errantes, e, por mais que nesta estação espacial não tenha hoje nem mais oxigênio e as capsulas de hibernação já estejam por um fio, a cada 20 ou 30 anos terrestres elas despertam para que o corpo não entre em colapso, me sinto como se não houvesse mais estação, nem caverna, nem mares, nuvens ou qualquer coisa palpável com uma saída.
É admirável e intenso como hoje vi uma nebulosa. Ela se
parecia com uma borboleta. Me diga meu irmão, estes animais ainda existem?
Tenho medo as vezes de perguntar as coisas, as respostas podem ser devastadoras
ou de fato nem chegarem a tempo. Talvez seja este mesmo o problema, o tempo.
Este é marcado, mas é falho, é implacável e quase sempre é triste. Quando vejo
algo muito brilhante no céu já penso em esperança, já imagino que vão me tirar
daqui, mas quase sempre são apenas destroços de naves espaciais ou cometas ao
longe que se espatifam na atmosfera terrestre. Ontem, de longe, Vênus deu o ar da
graça e me fez pensar que a esperança apesar de longe, pode ser ainda algo a se
agarrar. Hoje tomei consciência de que mesmo a deriva, estamos sempre em
movimento e este sempre será o mote para a realidade e o movimento, este é instantâneo.
Voltando ao limbo, este era apenas uma realidade que se foi
ao abrir os olhos. Ele foi real e ao mesmo tempo foi imaginário, de um lado o preto
do universo cravado de estrelas e do outro a câmara de hibernação de tampo
aberto e a sirene que insiste em tocar acusando a troca mais que urgente dos
cilindros de oxigênio e água. Os remédios acabaram também, os alimentos já estão
em racionamento. As sirenes tocam e a relatividade me choca com o céu e o
inferno diário, e neste momento nem mesmo o céu significa paz. Este hoje me
garantiu que Deus está morto.
“Libertar-se da mentira nunca quer dizer que a verdade foi
posta as claras. Significa que talvez o inferno chegou mais cedo que o
esperado. Os significados de chiaroscuro são tão amplos quanto uma pintura de Rembrandt
em meio ao mundo no qual vivemos e isto sim é tão amplo. A cada palavra que
descreve o todo, ele se amplia, por isso a libertação é algo extremamente duro.
Em verdade, a própria verdade pode ser também o encontro com seu próprio
tumulo.”
Faber Krystie McDonnadan
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