Bariloche (ou manual de procedimentos técnicos de segurança administrativa aos finais de semana pares, PARES, não Paris)



Hoje tive uma lembrança.

Enquanto escarafunchava memórias ainda que sólidas e ações que ainda mantinham vivas as perspectivas de um futuro daquele passado que se fazia cada vez mais claro, lembrei que estava ali, inerte, estagnada, parada, uma imagem que meu cérebro ainda se queima todo para entender, é importante dizer que não me lembro das suas feições e emoções daquele momento.

A vida era pacata, o momento era restrito, no meio da selva de sentimentos e promessas, “vi a cidade fervendo na emulsão da retina. Crepitar de vida ardendo, mariposa e lamparina. A cidade ensurdecia, rugia como um incêndio, era veneno e vacina”.

Observava tudo meio pixelado, meio esbranquiçado, lembro-me do ambiente claro do sofá verde/azul tiffany, do piso de madeira e das paredes brancas, lembro-me do quarto sempre escuro e das aranhas que moravam nas periferias do teto.

Lembro das plantas e dos arbustos e até dos barulhos noturnos que os vizinhos faziam, as garrafas de whisky no bar, a TV enorme, o cachorro medroso que latia para tudo e todos que arriscavam passar pelo corredor. O silêncio da madrugada quebrado pelo motor da geladeira velha ou pelo vizinho barulhento que subia as escadas como se estivesse pulando degrau por degrau, lembro-me bem do outro vizinho que um dia ao ameaçar seus animais de morte (quem nunca teve gato, não sabe o que é isso, não sabe o significado disso e não tem ideia de que tudo não passa de uma brincadeira que os animais nunca levam a sério) ganhou uma advertência graças a aquela ligação para a sindica, lembro dos bifes mal passados feitos em plena terça-feira 15h. Lembro da rotina, que não existia.

São tantas as lembranças alegres que se fazem vivas que quase me esqueci dos momentos infelizes, os mesmos que hoje sei que me fizeram ser muito melhor já que não há evolução sem sofrimento. Ainda lembro do escapulário, dos piruás durante as séries de TV, dos comerciais, das canetas roubadas, do sol que batia na janela e do vento que fazia em dado momento, lembro dos Domingos, dos Sábados, lembro de mudar a sala um milhão de vezes. Lembro de manter a sala do jeito que era primeiro, lembro de todos os jeitos como os travesseiros eram colocados e realmente me perco ao imaginar como é que tanta coisa ficou guardada em minha memória.

Ainda que com um sorriso semicerrado, meio frouxo, ainda que amarelo ou apenas de lábios, me deparei com tal confusão já que não fora desta vez que a alegria deu lugar a tristeza. A pesar de não ser desta vez que o acaso tenha me feito uma surpresa, não que eu tenha tentado muitas vezes, mas fiquei surpreso de que esta memória se foi, a única coisa que ainda não consegui lembrar hoje, foi o seu rosto.




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